segunda-feira, 1 de fevereiro de 2016

Delegado Cangaceiro

O Delegado que Virou Cangaceiro
 
Contemporâneo dos Limões (1865/1879), Liberato Cavalcante de Carvalho Nóbrega foi o delegado que virou cangaceiro. Com base em informações obtidas nos livros ¨Cônego Bernardo¨ e ¨Cangaceiros do Nordeste¨, publicados no século XIX, pelo escritor paraibano Pedro Batista, o memorialista Trajano Pires da Nóbrega em sua obra genealógica¨A Família Nóbrega¨, editada em 1956, apresenta  a história do jovem produtor rural  Liberato Cavalcante de Carvalho Nóbrega que foi nomeado delegado da Serra do Teixeira, no sertão paraibano, nos idos dos anos60/70 do século XIX, e depois, por razões, igualmente políticas, seguiu a trajetória do cangaço.
Cadeia Pública de Teixeira/PB
 
O resgate da história de Liberato foi possibilitado porque Trajano teve acesso a história oral relatada por dona Francisca Rodrigues, viúva de Francisco Benigno, mais conhecido como ¨Benigno Caluete¨, uma das vítimas do cangaço de Liberato. Dona Francisca se casou, em segundas núpcias, com Francisco Vicente de Araújo, habitante da cidade de Patos na Paraíba e amigo do escritor Trajano da Nóbrega.
Patos/PB - 1915
 
Segundo relatos da tradição oral, Liberato era corpulento, calado, retraído, benquisto e respeitado. Sua área de atuação se restringiu as circunvizinhanças da Serra do Teixeira, com epicentros na própria Vila do Teixeira, em Patos e em Santa Luzia, ambas no sertão paraibano.
Liberato, descendente direto da tradicional família Nóbrega, era bem relacionado com personalidades políticas de destaque na Paraíba, como o cônego Bernardo e o Dr. Manuel Dantas. O cônego Bernardo Carvalho de Andrade era primo de Liberato, a quem o considerava coirmão. Foi vigário do Teixeira, arcipreste (equivalente a Bispo) e deputado provincial da Paraíba. Outra personalidade do conjunto de relações sociais de Liberato era o Dr.  Manuel Dantas Correia de Góis, principal liderança da região. Era padrinho de Augusto, irmão de Liberato. Depois de certa relutância por parte de Liberato Nóbrega, Dr. Manuel Dantas o nomeou delegado do Teixeira, em comum acordo com o cônego Bernardo, de quem era amigo e compadre.
O principal objetivo da nomeação de Liberato como delegado era o enfrentamento aos Guabirabas, bando formado por três irmãos: Cirino, Juvino e João, além de um cunhado chamado Manoel Rodrigues. Segundo Trajano da Nóbrega, os Guabirabas eram criminosos insolentes e perigosos, vindo de Pajeú de Flores, em Pernambuco.
 No dia 21 de abril de 1862, o bando dos guabirabas saqueou a feira de Teixeira, promovendo roubos e todo tipo de depredação. Atirando a esmo, em trotes agalopados pela rua da vila, emitiam provocações a Liberato, que percebendo a superioridade numérica do bando, resolveu emboscá-lo na descida da serra. Um tiro certeiro de clavinote pôs fim ao bandoleirismo de Cirino Guabiraba. O trabalho de delegado de Liberato foi posto a prova,  quando  prendeu um apaniguado do doutor Dantas, acusado de homicídio, recebeu a recomendação para colocá-lo em liberdade, ao que Liberato respondeu em latim:  ¨dura lex, sede lex¨(a lei é dura, mas é lei), fato que desagradou profundamente, o doutor Dantas. Sabendo que teria um revide do chefe político, a partir desse momento, Liberato passou a ser apenas ¨o cabra da serra¨. Não foi só noções de latim que Liberato herdou dos religiosos que o protegiam.   Suas ações eram anunciadas com o soar de um sino. Quando tentou reassumir o posto, foi preso e recolhido ao cárcere pelo novo delegado, sob acusação de autoria de homicídios, dentre eles o de Cirino Guabiraba. O seu irmão Augusto passou a liderar o bando e tentou resgatá-lo, mas já era tarde. Uma tropa especialmente designada, para tal fim, recambiou Liberato para a cadeia pública de Parahyba, capital da província, aonde veio a falecer, depois de contrair varíola, durante a epidemia do final do século XIX.
Cadeia Pública de Parahyba
 
Em versos, o menestrel cordelista Leandro Gomes de Barros (1865/1918),nascido no Sítio Melancia, no município de Pombal, na Paraíba, que morou no Teixeira, registra a saga do bravo Liberato Nóbrega com os facínoras Guabirabas, o poema de Gomes de Barros está editado no livro Ao Som  da Viola, de Gustavo Barroso, publicado em 1921. Em sextilhas rigorosamente metrificadas, o poeta Ariano Suassuna (1927/2014) enaltece as ações dos irmãos guabirabas e o delegado-cangaceiro Liberato Nóbrega é mero figurante, em seu livro de poesias Os Guabirabas, publicado em 1943. Os Limões, arqui-inimigos dos Brilhantes, não fazem parte da memória suassuniana o seu magno Romance d’A Pedra do Reino e o Príncipe do sangue do vai-e-volta (1971) é dedicado à memória de seu pai João Suassuna (1886/1930) e  Jesuíno Brilhante (1844-79). No dia 14 de março de 2008, o poeta paraibano Gil Hollanda lançou em Caicó, capital do Seridó potiguar, durante café poético, com a presença do poeta Kydelmir Dantas, presidente da Sociedade Brasileira de Estudos do Cangaço (SBEC) e do repentista Chico Mota (1924/2011) o folheto de cordel ¨O Delegado que Virou Cangaceiro¨.


Livro de Gustavo Barroso
 
Epitácio Andrade, Chico Mota, Kydelmir Dantas e Gil Holanda
 

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